Dia dos Pais para quem?

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(Arte/Designer: @arthur.gargii)

Autor

Por: Juliana Ludovico

Texto da Matéria

Dia 14 de agosto de 2022, seria a data para comemorar o Dia dos Pais. Era para ser um domingo de alegria, almoço ao redor da mesa, conversas alegres e muito amor. Mas infelizmente essa não será a realidade de milhares de crianças e adolescentes que foram abandonados por seus genitores, porque convenhamos, esses “homens” não merecem ser chamados de pai. 

 

Talvez você deva estar se perguntando "Por que razão o Jornal Notícias ON vai abordar esse ponto da paternidade justamente neste dia?", a resposta é simples: É necessário pararmos de normalizar o abandono paterno. Homens abortam filhos todos os dias e não são julgados, culpados ou condenados pelo famoso tribunal da sociedade. Pelo contrário, o que as pessoas fazem é romantizar as mães solos, que não são guerreiras, são sobrecarregadas, mas que a sociedade tenta de todas as formas forçá-las a atender que são capazes e dão conta de criar seus filhos sozinhas. 

 

De acordo com a Agência Nacional, os cartórios brasileiros registraram, no início deste ano, o maior número de recém-nascidos identificados apenas com o nome da mãe. De janeiro a abril, foram registrados 56,9 mil bebês por mães solo, o maior número em comparação com o mesmo período de anos anteriores. O mais curioso é que neste ano o número de bebês nascidos foi o menor desde 2018. Logo temos menos bebês nascidos, porém mais crianças sem o reconhecimento de paternidade.

 

Dados como esse deveriam chocar a sociedade, deveria causar revolta, mobilização, como acontece com a mães que optam por deixar seus filhos com os pais, ou as que criam seus filhos mas seguem suas vidas, se relacionando com outras pessoas, saindo para se divertir e mais ainda aquelas que optam por interromper a gestação. 

 

E para ilustrar o quão difícil é a vida de uma mãe solo e como é doloroso crescer sem a figura paterna, conversamos com a leitora Alexandra Pereira que foi mãe aos 18 anos e abandonada pelo companheiro com quem tinha três anos de relacionamento e com seu filho Alan Pereira de 29 anos, fruto da relação.

Alan e Alexandra

 

“Eu comecei a namorar o pai do meu filho aos 15 anos, foram três anos de namoro até eu engravidar, eu tinha 18 anos. Isso foi em 1992, naquela época ficar grávida sem estar casada era algo que as pessoas condenavam. Eu fui criada pelos meus avós, minha mãe faleceu muito nova, meu pai sempre foi muito presente, mas já estava casado. Então imagina contar para dois idosos que eu estava grávida tão nova! Graças a Deus eles me acolheram, me apoiaram, meu pai também me apoiou e ajudou em tudo. O pai do meu filho me acompanhou durante toda a gestação, mas assim que Alan nasceu as coisas começaram a ficar estranhas e ele sumiu. Daquele momento em diante eu entendi que apesar de todo apoio da minha família eu ia precisar ser forte e entender que precisaria viver por mim e por ele. Não foi fácil, tive uma depressão pós parto (que na época não sabia o que era), mas logo  me reergui e fui enfrentar a vida buscando o melhor para educar o meu filho e sempre dando todo amor. Eu tive o privilégio de ficar com ele em casa  nos seus dois primeiros anos de vida, até que com a ajuda do meu pai consegui um emprego,  onde estou até hoje. São 29 anos de dedicação e esforço e muita luta para poder dar o melhor para meu filho, por muitas vezes não estive presente na vida dele por trabalhar o dia todo, mas era necessário o sacrifício, pois tudo que fiz foi por ele. O pai dele nunca foi presente ao longo desses anos, na verdade ele rara vezes veio pra saber notícias do Alan. Me sinto orgulhosa de ter conseguido, e agradeço o apoio da minha família nesse processo. Hoje meu filho é um homem bem educado, trabalhador e que me enche de orgulho e alegria.”

 

Esse foi o relato de uma mãe solo vencedora, que lutou bravamente para educar seu filho. Mas agora vamos saber como foi para o Alan crescer sem a figura paterna.

 

“Crescer sem a figura paterna foi um ato de resistência mesmo que durante um período eu não soubesse o que era resistir. Vou dar um exemplo de resistência, pode parecer banal, mas me marcava, nas reuniões de pais eu não tinha minha mãe participando, porque ela precisava trabalhar pra me criar, e parte dessa ausência foi culpa da ausência dele. Se não fossem meus bisavós ou minha tia Daniela que por muitas vezes fez esse papel de mãe na  minha vida, eu teria sofrido muito. Eu tive pouco contato com meu pai, e o pouco que tive não fui ruim, eu até que tenho boas lembranças, porém, uma coisa que me marcou muito e que me machucou, foi uma vez que meu pai atrasou a pensão e minha mãe pediu que eu ligasse para ele pra perguntar quando ele ia depositar o dinheiro, na época eu fazia tratamento dentário e precisava da grana, para pagar. Eu lembro que na época até comentei com a minha mãe que não me sentia confortável, mas mesmo assim liguei, e quando eu perguntei pra ele da pensão, ele foi super grosso, avisou que não tinha pagado e nem ia pagar, eu ainda tentei argumentar, falei que esse dinheiro não era pra minha mãe, que era pra mim filho dele, falei mais coisas e ele desligou na minha cara e desde então ele sumiu, virou a cara me esqueceu. Eu não procurei ele, não fui atrás, e confesso que sempre esperei as ligações dele no meu aniversário, nas datas comemorativas. Sou grato porque tive e tenho uma base familiar maravilhosa, mulheres que me criaram e estão do meu lado até hoje, que não me deixam desmoronar, e que supriram parte dessa ausência a parte de amor, educação e material, mas a parte afetiva tem um burraco, tem a falta dele. Para mim é muito triste ter um pai e ao mesmo tempo não ter, é como se ele estivesse morto, porque eu não o vejo, mas ele está vivo. Ele até tentou se aproximar de mim pelas redes sociais, mas eu cortei, porque o que ele quer é só ficar fuçando minha vida, ele não quer contato, porque moro no mesmo lugar que sempre morei, e ele sabe. Então eu entendo que ele não quer ficar perto de mim, ele só quer saber da minha vida. Eu sou grato a minha minha mãe por tudo, sei que ela se sacrificou por mim, e deu tudo que ela podia pra me educar. Se hoje estou aqui é graças a ela, ela é maravilhosa, uma mãe exemplar, uma pessoa que eu tenho muito orgulho de poder chamar de mãe. E meu pai ficou sendo meu avô, ele é a figura masculina que eu me espelho, ele sempre foi presente, amoroso, uma pessoa muito especial pra mim. Mas que fique claro a ausência do pai é uma lacuna, um lugar que dificilmente vai ser preenchido por uma outra pessoa, e essa ausência dói, machuca, mas não nos impede de seguir e ser um ser humano melhor”.

 

Infelizmente relatos como esses são comuns, essas pessoas estão entre nós, nas escolas, no ambiente de trabalho, na rua em que moramos, literalmente em todos os lugares, e diante de tanta indiferença e abandono a pergunta que fica é : Dia dos pais pra quem?

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